Desmatamento em Salvador: A Luta pela Preservação das Áreas Verdes
Em meio à urbanização acelerada de Salvador, o bairro de São Rafael apresenta um triste exemplo da luta para preservar áreas verdes. A região, conhecida por sua densa vegetação e pequenos cursos d’água, perdeu recentemente uma parte significativa de sua flora devido à construção de um novo empreendimento imobiliário. Embora as obras tenham sido temporariamente interrompidas pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), a devastação já causou um impacto palpável no ecossistema local.
Essa situação não é mera exceção, mas sim um retrato dos desafios ambientais que a capital baiana enfrenta, especialmente em um contexto de emergência climática. Salvador, com uma área total de 694 quilômetros quadrados e uma população de 2,4 milhões de habitantes, sofre com a pressão de novos projetos imobiliários, a expansão desordenada e a falta de regulamentação eficaz sobre o uso do solo.
As áreas do norte da cidade, em particular, sofrem com o desmatamento, especialmente nas proximidades dos parques de Pituaçu e Vale Encantado, assim como nas regiões periféricas como Mussurunga e Fazenda Grande. Um estudo elaborado pelo Ministério Público da Bahia em 2016 identificou mais de 5.000 áreas remanescentes da Mata Atlântica na cidade, das quais cerca de 3.000 estavam em estágio médio de conservação. Apesar disso, as medidas de proteção propostas não foram efetivas nas gestões recentes.
A promotora Cristina Seixas critica a falta de comprometimento da prefeitura em respeitar as áreas de vegetação primária e secundária, que deveriam ser protegidas de atividades de desmatamento. Ela destaca que muitas compensações oferecidas, como a doação de mudas, são insuficientes e não substituem a importância das florestas já existentes.
Além da vegetação, o desmatamento trouxe consequências diretas à fauna local, que perdeu seu habitat e, em muitos casos, buscou abrigo em residências da vizinhança. Os moradores de São Rafael manifestam preocupação com a perda do microclima, essencial para o lazer e bem-estar da comunidade. Vanessa Ramos, educadora de 38 anos, enfatiza o impacto na qualidade de vida, afirmando que "não há mais sombra nem ar fresco".
A situação se agrava em outras áreas, como a Fazenda Grande 4, onde a destruição de vegetação também afetou locais sagrados para as religiões de matriz africana, que usam a flora para práticas religiosas e oferendas.
Um dos pontos de resistência em Salvador é o Parque Ecológico Vale Encantado, que precisa de mais proteção contra investimento imobiliário. Embora tenha sido identificado como um corredor ecológico com vasta vegetação, a área está ameaçada por propostas legislativas que visam sua redução. É crucial que tais espaços continuem a existir, especialmente diante das mudanças climáticas.
O parque de Pituaçu, também gerido pelo estado, enfrenta pressões semelhantes, com as delimitações da área sendo revisadas ao longo do tempo. A falta de arborização em áreas densamente povoadas de Salvador, destacada pelo recente Censo, revela que cerca de 1,5 milhão de habitantes vivem em regiões sem a presença de árvores, afetando diretamente as condições de ventilação e sombreamento.
Além do desmatamento, a venda de terrenos públicos, em grande parte ocupados por áreas verdes, representa uma preocupação crescente. Em 2023, a Câmara Municipal aprovou um projeto que autorizou a venda de 40 terrenos, mas algumas transações foram barradas por decisões judiciais.
A Prefeitura de Salvador, por sua vez, defende que segue a legislação vigente e destaca um estudo que indica a cidade como a segunda capital com maior proporção de vegetação urbana, embora muitos questionem os critérios utilizados para essa afirmação.
O Inema também se posiciona, afirmando que está monitorando as áreas com vegetação nativa e tomou medidas preventivas, como o cercamento de parques.
Diante de todos esses desafios, a preservação das áreas verdes em Salvador se torna uma tarefa urgente para garantir não só a biodiversidade, mas também a qualidade de vida dos seus habitantes, crescente na medida em que a cidade lida com as consequências das mudanças climáticas.